Maria Luisa Vital
Em 18 de abril, comemora-se o Dia Nacional do Livro Infantil, essa data foi escolhida, por ser o dia do nascimento do escritor Monteiro Lobato, considerado por muitos, o pioneiro na escrita voltada para o público infantil. Esse dia é comemorado para relembrar a importância que a leitura de conteúdos próprios para crianças tem na formação delas como futuros leitores.
Nascido em Taubaté, no estado de São Paulo, Lobato mostrou desde pequeno grande desenvoltura para a leitura e, conforme seu crescimento, foi se interessando por escrever histórias que colaboraram para o desenvolvimento de milhares de crianças em todo o Brasil. É impossível negar a importância que o autor tem para a literatura infantil, entretanto, é necessário pontuar que suas obras, tão aclamadas, também possuem pontos questionáveis para a percepção de uma criança. A problemática está no fato de conter em seus contos e histórias, falas e ideias de cunho racista e hegemônico.
Em seu livro “As caçadas de Pedrinho” (1933) é possível encontrar expressões como “macaca de carvão” e “carne preta” para ofender a tia Nastácia, personagem negra de suas histórias. Diversas vezes, tia Nastácia é descrita como preta, negra, não como uma forma de resistência e, sim, de desqualificação, como se a cor de sua pele a deixasse inferior aos outros personagens, que não chegam a ter seu tom de pele depreciado, ou sequer, mencionado.
Um dia, lendo um texto, vi a seguinte frase “não se pode julgar com os olhos de hoje a história de um século anterior”. Realmente, é complicado julgar um autor que viveu em uma época em que atitudes e falas racistas eram vistas com naturalidade, mas não se pode aceitar que as crianças leiam e interpretem isso com a mesma naturalidade.
Estamos vivendo em um século no qual pautas antirracistas estão sendo colocadas e discutidas a todo momento no debate público, e a busca por melhorias nesse ponto é feita de maneira incansável por diversos movimentos. Saber que as crianças estão tendo acesso a histórias que contemplam e, de alguma forma, colocam como aceitável esse posicionamento, é um tanto quanto frustrante.
Em 2010, foi protocolada uma denúncia, por parte da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, que acendeu a discussão e pôs na mesa as possíveis complicações que a leitura de algumas partes dos contos de Monteiro Lobato poderiam trazer às crianças, que estão em processo de desenvolvimento, quando têm acesso aos seus livros. Seriam os contos de Monteiro Lobato uma forma de perpetuação de preconceitos? Esse é o ponto.
As crianças não têm a mesma mentalidade dos adultos, ou seja, elas não conseguem discernir aquilo que é razoável, daquilo que é intolerável. Mesmo havendo a explicação dos professores, alguns pontos podem se tornar fixos em seus pensamentos e enraizados em suas personalidades. Sabemos que o racismo estrutural é um ponto muito forte em nossa sociedade, não é preciso que as crianças entrem nesse ciclo tão cedo.
Obras como “Narizinho Arrebitado” (1921) e “Emília no país da gramática” (1934) são importantes referências para os pequenos, pois com seu mundo lúdico e bem idealizado, eles aprendem e tomam gosto pela leitura, mas tem que se ter cuidado. É fundamental que elas leiam, contudo, é mais significativo que elas leiam conteúdos que ajudem-nas a querer ser melhores, e não que as coloquem como reprodutoras de pensamentos antiquados e preconceituosos.
Não estamos aqui para desconsiderar toda a história que o autor construiu em prol da literatura infantil, no entanto, figuras de grande importância para o cenário nacional, como Monteiro Lobato, não devem ser protegidas, de maneira que não se faça críticas a suas obras. Acredito ser oportuno que as obras infantis de Lobato sejam revisadas e passem a servir somente para aprendizado e não para continuação de preconceitos. Monteiro Lobato foi grande, mas suas atitudes racistas também!
Autor
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É estudante de Jornalismo na Unesp de Bauru, em São Paulo. Gosta das coisas boas da vida - ler, escutar música e curtir a família. Por se interessar tanto por política, concorda com Aristóteles: "O homem é um ser político".
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